18.4.11

Culpa moderna

Em termos de música, 2011 começou muito bem. Pelo menos nominalmente. Já houveram, nesses quatro primeiros meses do ano, lançamentos de artistas grandes e de outros que, pessoalmente, gosto muito. Peter, Bjorn and John; The Kills; The Raveonettes; Foo Fighters; Radiohead; Tv On The Radio... e provavelmente mais alguns que não estou lembrando. O fato é que foram grandes lançamentos, mas nenhum, pelo menos até agora, me chamou tanto atenção como álbuns de outros anos ou que já tinha ouvido antigamente. Se tivesse de citar os álbuns nos quais viciei nesse começo de ano, citaria "Some Place Simple", de Martina Topley-Bird; "Extraordinary Machine", de Fiona Apple; "Adios Amigos!", dos Ramones; "Surrealitic Pillow", do Jefferson Airplane; e "IRM", de Charlotte Gainsbourg.
Uma atenção especial para esse último, que conheci em 2009, ano de seu lançamento, mas só vim compreendê-lo melhor recentemente. Charlotte Gainsbourg, além de ser uma atriz fantástica (vide "Anticristo"), mostrou para mim que é muito capaz de fazer um álbum inspirador, cheio de personalidade e com músicas incrivelmente boas. Aí descobri que ela não o fez sozinho: houve também o dedinho de Beck.
Beck é meio que uma criatura onipresente na música alternativa contemporânea. Quando você menos espera, ele está lá, produzindo um álbum, fazendo uma participação especial num show, escrevendo músicas. E, assim como ele é a banda Sex Bob-Omb do filme "Scott Pilgrim vs. The World", ele estava presente no IRM de Charlotte. Então, de certa forma eu sempre ouvi falar em Beck. Não lembro ao certo como ouvi falar sobre ele pela primeira vez... não sei se foi um comentário de uma amiga, ou uma nota da Rolling Stone sobre o álbum "The Information", lançado na época. Só lembro que foi assim, se esgueirando sorrateiramente, que ele chegou até mim. 
Por um motivo ou por outro, no entanto, eu nunca dei atenção alguma para o americano branquelo. Não ouvi o The Information, não procurei suas músicas, nem seus vídeos ou projetos paralelos... apenas sabia que existia esse músico, que ele se chamava Beck, e que ele era para se dar alguma importância. Mesmo quando ele iniciou o que eu acho que seja um de seus projetos mais legais, o Record Club, eu não liguei.
O Record Club é um sonho para qualquer fã, para qualquer músico e para qualquer criativo... trata-se de uma reunião entre Beck e mais alguns artistas para gravar um álbum em um dia. Os artistas convidados variam de edição para edição e sempre possuem alguma relação com o álbum escolhido para ser regravado. É uma experiência incrível e um projeto genial que eu só vi, creio eu, duas vezes(!). Uma música do Velvet Underground e uma outra do INXS, com participação de Sérgio Dias, d'Os Mutantes.
Olhando para trás e percebendo a quantidade de coisas interessantes com as quais Beck se envolveu ao longo da sua carreira eu não posso evitar e me perguntar: "Por que eu não me interessei em conhecer o trabalho dele antes?". Foi somente em 2009 que baixei a primeira música: "Soul of a Man", descoberta através de uma propaganda. Imediatamente se tornou uma das minhas músicas preferidas e hoje em dia é uma música determinante para mim, de forma muito pessoal. Nunca me canso de ouví-la e quando nada mais na biblioteca de mp3 parece bom para o momento, Soul of a Man está lá. Ela permaneceu solitária até algumas semanas atrás, quando, incentivado pelo trabalho de Charlotte Gainsbourg, eu resolvi fazer o que já devia ter feito há anos: escutado o "Modern Guilt".
Modern Guilt é o último álbum de estúdio de Beck, e foi lançado em 2008. Entre as suas faixas está "Soul Of A Man", o que por si só já seria um ótimo motivo para que tivesse prestado atenção no álbum antes. Um outro motivo é a arte de capa, que já conhecia também. Design moderno até o talo, com Helvetica, grid poderoso e tudo o mais, é simplesmente linda e fala com meu estilo pessoal diretamente.
E, oh cara, não é só a arte que fala comigo. O trabalho inteiro me inspirou de uma forma que havia muito tempo um álbum apenas não conseguia fazer. É uma peça coesa, com espírito, personalidade e uma verdade características. Carrega uma jovialidade tosca, típica de um CD de rock, ao mesmo tempo que carrega uma melancolia, uma culpa mesmo. Uma culpa por estar ali, culpa por tudo estar do jeito que está, mesmo sem ter feito nada diretamente para contribuir com isso. E talvez essa mesmo seja a culpa moderna: o não fazer nada para consertar o estrago todo. Mas esse é um assunto para outra hora.
Não é só o Modern Guilt. Beck tem feito umas coisas bastante inspiradoras mesmo. Seu site, por exemplo, é um poço de conteúdo. Não apenas pelo Record Club. Descobri recentemente o Irrelevant Topics, uma espécie de coluna onde ele publica conversações com outras pessoas. Li o seu diálogo com Caetano Veloso, de quem também sou fã, e não é apenas inspirador, como também apaixonante. São dois músicos, apaixonados por música, conversando sobre música. Eles também são fãs, afinal.
O trabalho de Beck anda me inspirando também na realização do meu trabalho. Somente o clima do Modern Guilt está me rendendo muitas ideias, algo que só um trabalho com tamanha personalidade pode fazer. E ele me desperta uma espécie de ânimo também. Não pelo fato de possuir um clima animador, mas mais pelo fato de saber que tem gente que sente como eu por aí.
Taí... não ter ouvido o Modern Guilt, de Beck, antes. Essa é a minha culpa.

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